A polémica surge de um único item de escolha múltipla sobre particípios passados em francês. A pergunta parece banal. Os resultados, nada banais.
Um teste de 1985 que ainda faz mossa
Investigadores do Centre national d’étude des práticas linguísticas relatam uma diferença surpreendente. Mais de 82% dos adultos falharam o acordo esperado numa regra padrão, outrora ensinada no início do ensino secundário. A regra dizia respeito aos objetos diretos e particípios passados com “avoir”. O mesmo tipo de pergunta apareceu em fichas de 1985 para alunos de 13 a 14 anos.
O item diz: “Les lettres que j’ai ______ hier ont été envoyées ce matin.” As opções incluem écrite, écrites, écrits e écrité. Só uma corresponde à regra. Três não. Os adultos tenderam a hesitar. Muitos adivinharam. Poucos aplicaram um método.
Oito em cada dez adultos perderam pontos num acordo básico porque não identificaram o objeto direto antes do verbo.
O que a regra exige
O francês usa o acordo do particípio passado em situações restritas. Com “avoir”, o particípio só concorda quando o objeto direto aparece antes do verbo. Na frase acima, “les lettres” aparece antes de “ai écrit”. O objeto é feminino plural. O particípio deve concordar. A escolha correta é “écrites”.
Regra, numa linha: com “avoir”, faça o particípio concordar com qualquer objeto direto precedente; caso contrário, deixe-o inalterado.
Sinais de uma mudança mais ampla
Professores formados nos anos 80 descrevem exercícios intensivos de acordos, pronomes e complementos. Muitos achavam o conteúdo enfadonho, mas praticavam-no todas as semanas. Desde os anos 2000, alterações curriculares deram mais peso a projetos de escrita, competências orais e compreensão de médias. Esses objetivos são importantes na vida moderna. A alteração também reduziu o tempo dedicado à análise técnica e à correção formal.
Comparações internacionais, como o PISA, registam uma ligeira descida na precisão mecânica. Avaliações nacionais refletem a mesma tendência nos acordos e na pontuação. Os adultos jovens escrevem mais, mas revêm menos. Plataformas de mensagens valorizam a rapidez, brevidade e autenticidade. O texto preditivo mascara erros e reduz a vigilância. Empregadores relatam mais gralhas nos emails. Editores passam mais tempo a corrigir erros básicos.
Por que muitos adultos falham
- Menos tempo de aula dedicado à análise de frases e exercícios de acordo reduz a automatização.
- As famílias transmitem menos normas escritas à medida que a leitura passa para ecrãs e áudio.
- Publicações de formato curto normalizam a tolerância à ambiguidade e ao registo misto.
- O corretor automático corrige erros superficiais e desincentiva a lembrança da regra.
- A falta de professores e os programas sobrecarregados limitam a prática espaçada da gramática.
Hoje escreve-se mais do que nunca, mas pratica-se menos os movimentos lentos e precisos que o acordo exige.
Os números que alimentam o debate
| Ano | Percentagem que escolheu a forma correta | Grupo |
| 1985 | 78% | Alunos do último ano do 3.º ciclo |
| 2025 | 18% | Adultos dos 25 aos 45 anos |
O contraste intensifica o debate sobre declínio versus mudança. Uns veem uma perda de conhecimentos essenciais. Outros veem um novo equilíbrio: mais comunicação, menos análise formal. Ambos apontam para a mesma frase. Dela extraem histórias diferentes.
Um método rápido que ainda funciona
O método ajuda quando a memória falha. Os leitores podem fazer uma verificação em três passos que demora segundos e poupa pontos.
- Identifique o particípio e o seu auxiliar.
- Pergunte ao verbo “o quê?” ou “quem?” para encontrar o objeto direto.
- Verifique se esse objeto aparece antes do verbo; se sim, faça o acordo; se não, não faça.
Esta rotina reduz a carga cognitiva. Elimina “palpites”. Transforma uma pergunta-pedra numa rotina previsível.
Como a mesma competência tem impacto noutras áreas
Praticar o acordo melhora a precisão na leitura. Leitores que analisam os objetos desde cedo acompanham melhor os pronomes. Escritores que aplicam a regra reduzem as revisões. Professores que modelam os três passos veem progressos mais rápidos nos ditados. Editores poupam tempo em relatórios longos. Alunos readquirem confiança após alguns exercícios cronometrados.
Exercícios curtos e frequentes são melhores do que lições longas para criar reflexos automáticos de acordo.
O que as escolas podem ajustar sem revolucionar os programas
Os departamentos podem recuperar a prática do acordo dentro das tarefas já existentes. Os professores podem acrescentar microexercícios aos ateliers de escrita e ao trabalho oral. Os alunos podem anotar um parágrafo para objetos e verbos antes de rever. A revisão entre pares pode incluir uma linha sobre os acordos de particípio. Os trabalhos de casa podem trocar um exercício de compreensão por uma linha dedicada ao acordo.
- Faça uma “caça ao objeto” de 90 segundos no início da aula.
- Use um mini-ditado semanal focado numa regra.
- Rode funções: um aluno procura objetos, outro auxiliares.
- Grave um áudio breve a explicar uma escolha de acordo.
Onde os adultos podem reconstruir o hábito
Os adultos podem treinar em pequenas sessões. Escolham dez frases de emails ou notícias. Marquem verbos, auxiliares e objetos. Apliquem a regra. Registem erros e padrões. Desliguem o corretor automático do telemóvel durante 15 minutos por dia. Leiam uma página de prosa literária em voz alta. Copiem uma frase à mão e assinalem os acordos. Passos pequenos acumulam ganhos ao longo das semanas.
Um teste que suscita uma questão cultural
O item de 1985 faz mais do que distinguir certo e errado. Ilumina aquilo que a comunidade valoriza na escrita. A França sempre valorizou o acordo exacto como competência cívica. Nos locais de trabalho ainda se recompensa a prosa cuidada. Os exames ainda avaliam este aspecto. As redes sociais e as mensagens de voz mudam os hábitos. A tensão está em cada caixa de entrada.
Uma frase banal funciona como espelho. Reflete opções de ensino, hábitos mediáticos e expectativas no trabalho.
Termos a reter
- Objeto direto: nome ou pronome que recebe a ação sem preposição.
- Auxiliar: o verbo que forma tempos compostos, como “avoir” ou “être”.
- Particípio passado: a forma usada em tempos compostos que pode assumir acordo.
Os pais que querem ajudar podem fazer um pequeno jogo semanal. Ler uma frase, esconder o particípio e pedir à criança para identificar o objeto. Revelar as opções e escolher a terminação certa. Valorize o método, não o palpite. Registe o tempo e tente reduzir alguns segundos na volta seguinte. As crianças gostam de progresso visível e regras claras.
Os gestores podem reduzir erros acrescentando uma checklist de um minuto aos modelos de equipa. Coloque um lembrete perto da assinatura: “Os particípios passados com avoir foram verificados para objetos precedentes?” Um simples lembrete aumenta a atenção. Equipas que padronizam estes avisos têm menos correções a jusante e arquivos mais limpos a cada trimestre.
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